segunda-feira, janeiro 09, 2017

- ars longa, vita brevis -
hipócrates

antes e depois ou como "se um Degas engana muita gente, um Degas e um Picasso elucidam muito mais. Fala-se sobre a vida sexual de Degas. Quer dizer, não é que eu fale disso com as minhas amigas, mas em relação ao artista impressionista, fala-se sobre a sua vida sexual. Não se sabe que tenha sido casado, ou sequer tido casos amorosos, mas sabe-se que pintou mulheres incessantemente: a tratar da roupa, após o banho, a dançar ou mesmo a seduzir. Veja a propósito disto este livro e a quantidade de imagens de Degas acerca deste tema. Os coetâneos dele disseram-no incapaz de amar uma mulher ou até sensível ao ponto de sentir que a vida sexual poderia retirar-lhe tempo e ânimo para o trabalho. Van Gogh, que o admirava disse que não conseguia ter uma ereção e sofria com isso. Não sei como é que o Van Gogh poderia saber uma coisas dessas e nem quero pensar nisso (lagarto, lagarto, lagarto). Certo, certo é que a obra deste celibatário (casto e virgem, desconheço) despertou o interesse de um homem, um artista, que de casto, puro, virgem e abstémio não tinha nada. O seu nome: Picasso. Ao que parece, não lhe faltava auto-confiança nem auto-estima. Um dia aproximou-se de uma jovem, bela (claro) e terá dito: "O meu nome é Picasso, gostei de si, quero desenhá-la". O que faltava a um, tinha o outro com fartura. Quer dizer, isto sou eu a dizer. Talvez Degas não fosse assim um homem tão tímido como fazem crer os registos que da vida dele chegaram até nós. E nem sempre a timidez é impeditiva de chegar tão longe quanto os outros, no que às relações amorosas e/ou sexuais diz respeito. 

Bom, mas isto para dizer que Picasso viu em Degas e no seu desenho algo. Talvez não fosse o génio de Degas, já que esse parece ter tido importância apenas para os que se lhe seguiram de imediato, como Van Gogh. Cézanne por exemplo é muito mais importante para gerações futuras que Degas, ainda que Degas e Cezanne pertençam a gerações diferentes. O que quero dizer com isto, é que se existisse um podium para as influências que Picasso sofreu, Degas talvez não figurasse no mesmo. Ao contrário de Cézanne, cuja influência abrangeu muitos dos seus sucessores, Degas tocou talvez menos artistas. Isto não lhe retira o mérito. Nenhum mesmo. Admiro nele a paleta (com cores que parecem erradas e dão uma atmosfera irreal aos quadros - vejam-se as pinturas das mulheres no banho), o tratamento do feminino com grande expressividade dos corpos (mais nas mulheres que passam a ferro do que nas bailarinas, confesso) e uma certa "paz poder", uma tensão qualquer, uma violência encoberta que o momento captado surpreende e esconde. 

É nas mulheres a trabalhar que pego: nas mulheres que passam a ferro, ou tratam da roupa. Quem passa a ferro, sabe que há gestos, poses involuntárias, expressões que são típicas. E ele captou-as muito bem. O Picasso também deve ter percebido isso. Depois de ter apresentado este antes e depois, descobri que há um outro antes e depois envolvendo Degas, Picasso e as mulheres que engomam. Ora vejam lá:

















Degas
Laundress 
1868-1878
Norton Simon Museum























Pablo Picasso
La Repasseuse
1904
Guggenheim Museum, Nova Iorque

Obviamente, existe aqui algo a que não podemos ser alheios: esta pose só se justifica com os ferros a carvão que davam um trabalhão desgraçado: fazer brasas (ou manter o lume para obter brasas), colocá-las no ferro, limpar tudo para não manchar a roupa... Devia ser dose... Talvez a primeira mulher esteja cansada e a segunda, derrotada, não sei. Mas acho que o Picasso atribuía a isto um qualquer valor que não era só técnico.

Estava com saudades de posts destes. Embora não tenha descoberto as minas de sabão amarelo...