terça-feira, novembro 10, 2015

- ars longa, vita brevis -
hipócrates

caros amigos, como "estaindes"? nós bem, obrigada. quer dizer, tem dias, mas quando os dias não correm de feição, eu prefiro ficar calada, cá no meu canto. [um destes dias estava a falar de signos com duas pessoas. eu e outra somos aquário. a terceira, que é capricórnio, disse que os aquarianos eram muito calmos, falavam pouco e deviam falar mais. parecia que algo os agrilhoava. e sim, é verdade. (isto a propósito de ficar calada). mas isto de ficar calada tem coisas boas. agora de repente é que não me lembro de nenhuma...]. bom, vamos ao que interessa. nem sei se posso dizer que isto é um "antes e depois" ou um "ao mesmo tempo". Não gosto do Renoir, já havia dito isso aqui. E não estou a escrever isto por causa das manifestações em Boston. Já antes, para mim, o Renoir era demasiado doce. É como um cupcake com tanta cobertura, tanta decoração que o sabor se perde e só de olhar já nos sentimos enjoados. Mas gosto do Monet e é por ele que vou começar. Monet e Renoir conheciam-se. Em 1869 eram ambos apenas dois jovens artistas, quase miseráveis, a tentar sobreviver em Paris. Tanto um como outro queriam pintar esta cena das banhistas na Grenouillere que era, no seu tempo, uma espécie de instância de banhos para a classe média. Pintá-la, era pintar a vida ao ar livre, do cidadão comum, do divertimento e lazer, repleta de movimento (o das águas, das folhas das árvores, dos vestidos, das pessoas). Maupassant por exemplo descreveu o espaço não como uma estância de banhos, um resort, mas como um lugar de encontro de bêbados e prostitutas. Diz que elas se pintavam demasiado, com rouge, baton e sombra nos olhos, tinham seios fartos e e péssimo gosto a vestir. Os homens, segundo Maupassant eram uns gigôlos de luvas claras e monóculo sempre a seguirem a presa. Monet pintou a pequena ilha entre o café flutuante e a margem da Ile de Croissy e não lhe ocorreu criticar a actividade que ali tinha lugar, talvez porque tanto ele como Renoir pertenciam à mesma classe social daquelas mulheres e homens. Por isso, tanto um como outro optam por retirar da cena o que ela tem de degradante, mostrando apenas o que era feliz e belo. Só que enquanto Renoir é atraído pelas pessoas e pelo seu domínio na e da cena, Monet por outro lado abarca o todo e as pessoas. Esquece o movimento de barcos e barqueiros, o barulho que podemos adivinhar nas vozes altas e nas gargalhadas, e evoca o silêncio parcial da natureza (tal como já disse, o roçagar dos vestidos, as ondas a baterem no casco dos barcos, as aves, as folhas ondularem ao vento, etc...). É interessante ver que o ponto central de interesse do quadro permanece em sombra, sendo que a luz do Sol entra dos cantos superior esquerdo e direito, mas não penetra na pequena ilha.
Com Renoir a cena é mais feérica. Mesmo descontando as diferenças de cor - que podem dever-se à falta de qualidade das imagens que encontrei na internet, a cena de Renoir pinta é muito mais cheia, mais povoada, não dando espaço para o silêncio que parece pautar o quadro de Monet. Senão vejamos: no quadro de Renoir há mais gente na água; há mais barcos (ocupam a parte de baixo da cena); os vestidos criam mais volume, o que nos leva a pensar que a pequena ilha tem mais mulheres e homens; a árvore tem os ramos pendentes para a água; a vegetação é mais densa e não deixa ver o céu ... enfim, tudo isso nos faz pensar num Domingo à tarde. E não me estou a referir a Seurat. Estou a referir-me mesmo ao Domingo à tarde. Quem já não foi passear para um hipermercado num Domingo à tarde? Quem já não ficou preso no trânsito a caminho da praia num Domingo à tarde? Quem já não foi a um jardim passear num Domingo à tarde e teve de encontrar 3000 pessoas conhecidas e filas para andar? Eu já. beijinhos às famílias, lavem os dentes, durmam bem e não façam xixi na cama que isto não está tempo para secar roupa.
















Monet
Bathers at La Grenouillere
1869
Metropolitan Museum, Nova Iorque

















Renoir
La Grenouillere
1869
National Museum of Fine Arts, Estocolmo