terça-feira, março 08, 2011

- o carteiro -
não sei se este post vai ser do vosso agrado. do meu não é inteiramente porque gostaria de ter mais bases em teologia para explicar e expor a questão dos ícones com toda a clareza e de forma abrangente, mas como ainda não cheguei aí (e não tenho bibliografia e tenho tido o que fazer), trago (-vos, isto se estiver alguém desse lado) algumas considerações sobre Maria Theotokos; ou seja, Maria em Maestas, em Majestade. nem sempre o papel de Maria foi este, de rainha do céu e mãe de Cristo. e se falo disto é porque não só descobri que a construção da importância de Maria não foi pacífica, como a mesma esteve sujeita a muitos condicionalismos não só teológicos, mas também figurativos. por exemplo: apesar de Cristo ser Pai, Filho e Espírito Santo, os diferentes concílios tiveram de estabelecer se assim Maria era mãe do Pai ou do Filho; ou seja, se fosse mãe de Deus seria Theotokos, mas se fosse mãe de Cristo seria apenas Christotokos. Sei que hoje diríamos que ela é mãe do filho, de Cristo, mas como ser mãe de Cristo e ele ser três coisas, sem ser mãe de todas as três. Estas eram questões que assaltavam os teóricos da época já que os escritos incluídos na Bíblia falam escassamente em Maria (acho que ela só fala uma vez no Novo Testamento) e os restantes eram considerados apócrifos. Da mesma forma foi necessário criar um passado para Maria - não obstante o seu "futuro" ter acabado com a morte do filho. Assim quando hoje celebramos a Imaculada Conceição não o fazemos porque Maria concebeu sem pecado (diz-se que Maria é Virgem antes, durante e depois do nascimento de Cristo). Celebramos pois a Igreja criou a figura de Ana e Joaquim, ambos pais de Maria, também ela concebida sem pecado. Por isso é que é Imaculada. Nem poderia ser de outra forma pois uma mulher que concebe sem pecado tem também ela de ser concebida sem pecado.

As preocupações com a importância de Maria num contexto paleocristão - em que o Cristianismo estava ainda a ser implementado como religião do Estado e por razões políticas e em que a morte de Cristo ainda estava muito presente e portanto, era necessário ser o mais fiel possível já que São João, por exemplo ainda estava vivo e não se podia deturpar a sua memória, e ser ao mesmo tempo o mais persuasivo possível - estendem-se até à sua representação e principalmente a esta. Hoje não notamos mas a iconografia de Maria (que no Ocidente foi muito alterada com o passar dos séculos e no Oriente, devido à crise iconoclasta, ficou praticamente inalterada) tinha regras às quais obedecia. Segundo o Cristianismo Ortodoxo existem cinco representações da Virgem: em oração ou Oranta, a que guia ou Hodigitria, a terna ou Eleusa, a Misericordiosa ou Panakranta e por fim a Intercessora ou Agiosortissa. Uma das mais antigas é a Oranta, Panagia ou Senhora do Sinal; ou seja, Maria em oração que se apresenta de frente para o observador, de pé, com os braços abertos e flectidos a rezar como se fazia antigamente e um pé mais avançado face ao outro. Na sua base é Maria em oração; ou seja, Oranta, mas no Oriente era chamada de Panagia ou Platytéra ou mesmo Senhora do Sinal pois o momento em que esta imagem é captada é o momento da Encarnação, como dito por Mateus: "Eis que a virgem conceberá, e dará à luz um filho, E chamá-lo-ão pelo nome de Emanuel, que traduzido é: Deus conosco". Em todas elas Maria pode ter na seu seio o Menino numa mandorla ou até a sair de dentro de um cálice.

Uma outra, a Agiosortissa ou Deésis, mostra Maria posicionada ao lado de Jesus, geralmente do lado direito Dele ("À vossa direita Senhor a Rainha dos Céus ornada do ouro mais fino"), esquerdo da pintura, a olhar para o lado esquerdo onde se encontra Cristo ou um ícone Dele. Se bem que, segundo a imagem que aqui mostramos, a partir do momento em que ela está a olhar para ele, ele é que é o ponto fulcral da pintura e não ela. Mas adiante... esta figuração da Virgem é para mim muito complexa pois a nomenclatura não é consensual e para além disso há misturas; ou seja, há por exemplo Panagia Agiosortissa.

Para além destas que referimos encontramos outro tipo que na minha opinião é também passível de confusões. Chama-se Panakranta com Misericordiosa e apresenta-se como a Panagia, mas sentada com o filho no colo. Ela está de frente para nós e ele também como se ambos estivessem a presidir ao trono do Mundo; ou seja, são ambos figuras reais. Esta representação vem de uma determinação do Concílio de Calcedónia por volta do ano 400 que dizia que tanto Maria e Cristo presidiam ao destino do Mundo.


Segue-se a Hodigitria e por fim a Eleusa que parecendo que não, têm diferenças entre si. A Hodigitria é a Virgem que tem o filho ao colo e aponta para ele com a mão direita, enquanto o Menino aponta para a frente ou ergue dois dedos em sinal de benção também com a mão direita enquanto a esquerda segura (dependendo das representações) um pergaminho. Como ela aponta para ele e ele é o caminho, ela chama-se também a Virgem que guia. João escreveu: "Disse-lhe Jesus: Eu sou o caminho, e a verdade e a vida; ninguém vem ao Pai, senão por mim" (João, capítulo 14, versículo 6).
Por fim apresentamos a Eleusa que parece igual à Hodigitria, mas é diferente. Há de facto uma razão para se chamar "a Terna" já que mãe e filho estão de faces coladas numa alusão à relação entre afectiva, mais do que à relação de sangue. Aparece aqui a ideia de maternidade, que não existia nas outras imagens. Para além de muitas vezes surgirem de rosto colado, também é possível ver o Menino com a mão estendida para o rosto da mãe e a tocar-lhe embora a Virgem esteja sempre a olhar de frente para o observador. Existe uma variante deste tipo que é a Virgem do leite ou a Galaktotrophousa e que se encontra a amamentar o Menino.
E com esta me fico. Sei que já há muitas coisas escritas sobre a iconografia da Virgem, mas queria também escrever. Talvez esteja incompleto, mas que se lixe.