segunda-feira, julho 12, 2010

- o carteiro -


No livro "O médico e o monstro" Mr. Hyde é identificado, logo nas páginas iniciais com John Fell, um clérigo inglês que era odiado sem razão aparente. Mr. Hyde por esta altura do livro era um homem acossado, embora ninguém soubesse bem a razão para este ódio generalizado a tal personagem. Também um outro homem, este nem de ficção nem de religião e bem mais conhecido, sofreu as amarguras de se ser duplamente preterido, embora ressalvando as devidas distâncias, não estivesse à altura, em desprezo, de Mr. Hyde e John Fell. Courbet o pintor de "O Enterro do Conde de Ornans" e de "O Atelier do artista", precursor do Realismo francês pintou um quadro pouco conhecido intitulado "Regresso da Conferência". Jocoso e sarcástico até ao tutano, Courbet pintou o quadro com o propósito de chocar o seu público e conseguiu. No quadro (que foi queimado existindo apenas uma cópia mal amanhada), podemos ver um padre e outros representantes religiosos aparentemente ébrios no regresso de uma reunião num Domingo. Ao que parece pelo quadro, o repasto tinha sido farto e os padres beberam demasiado. O objectivo de Courbet, segundo Courbet, era chocar e por isso quando chegou ao Salão em 1863, tal foi conseguido. Rejeitado pelo Salão onde já havia exposto com algum sucesso - o Salão era sobretudo para os Académicos - tentou a sua sorte no Salão dos Recusados. E não é que aí também foi recusado!?

Não satisfeito Courbet tentou a sua sorte em casa própria, na Rue Hautefeuille e durante alguns dias manteve as portas abertas para ser visto por quem quisesse. E muitos foram os que viram este quadro de Courbet numa pequena exposição de Entartete Kunst. Os amigos realistas como Proudhon aplaudiram o feito do pintor, mas outros achavam que as acções de marketing faziam de Courbet mais um Salvador Dali in New York do que um Salvador Dali catalão. Aliás foi um empresário americano que fez uma pequena tournée com o mesmo por Inglaterra onde foi visto com algum sucesso: se existisse um Realismo Inglês seria demasiada realidade! Animado pelo feito, o pintor regressado a casa organizou uma outra exposição privada até para reunir os cerca de quarenta quadros seus que o salão tinha preterido e ao mesmo tempo para preparar a Exposição Universal de 1867. Mas Courbet foi tão mal sucedido que hoje seria o paradigma do artista comme il faut: bom a fazer, mau a vender (desculpem lá, mas eu acredito que quem é bom não necessita de o dizer). O quadro acabou de forma desconcertante, mas literariamente perfeita: um católico rico viu o quadro, comprou-o e queimou-o. O que existe hoje é apenas uma cópia do original, cópia essa que podemos ver aqui em baixo:
Gustave Courbet
Cópia de "Regresso da Conferência"
1863