segunda-feira, julho 12, 2010

-ars longa, vita brevis -
hipócrates

antes e depois ou como estava quase para atalhar nesta parte e não publicar este antes de depois. não achava nada publicável. Mas depois lá fui miscrolhando na net e ao ver este Bill Viola lembrei-me uma Anunciação. Como tal solução não me satisfazia, miscrolhei um pouco mais no WGA (Web Gallery of Art) e encontrei este Rogier van der Weyden que estava mais dentro daquilo que tinha previsto. Será escusado dizer - embora esteja a dizer - que às vezes estas coisas não saem naturalmente, é preciso miscrolhar muito.

O "antes" é de Weyden, de uma pintura que não conhecia. Weyden foi o pintor oficial da cidade de Bruxelas, numa altura em que a mesma era a mais importante cidade do ducado de Brabante. Apesar disto e de ser o local onde se situava uma das residências do duque da Borgonha, Bruxelas não tinha tradição artística anterior a Rogier van der Weyden e é ele que marca definitivamente esta urbe ("urbe" fica bem). A atribuição dos quadros a Weyden é muitas vezes incerta pois as diferentes fontes falam de inúmeros assistentes que com ele trabalhavam, não obstante a lei de Bruxelas permitir no papel apenas um. Sabe-se no entanto que o pintor usava de mão-de-obra de assistentes para finalizar os quadros e proceder ao tratamento de toda a logística necessária para levar a bom porto as encomendas. No que diz respeito a este quadro, é pouco provável que tenha sido outro que não Weyden a pintá-lo se tivermos em atenção a data - Weyden não teria tido tempo para instruir um discípulo ao ponto de este pintar como o próprio mestre. No entanto seria já possível que um ou outro aprendiz assinasse como sendo da oficina de Rogier, como aconteceu com muitos pintores antes e depois deste.

Esta pintura pertenceu a um painel encomendado para a Capela de Santo Huberto na Igreja de Santa Gudula em Bruxelas. Os nomes são estranhos, mas é mesmo assim. Do mesmo painel fazia parte um outro quadro, esse sim pintado por Rogier van der Weyden; ou seja, o quadro que aqui apresento deve ter sido pintado por um assistente de Weyden pois o outro é incomparavelmente melhor. Note-se que neste o Papa Sérgio surge enclausurado num túnel devido ao primitivismo do efeito perspéctico que procura agregar no mesmo espaço diversos tempos. Esta cena conta a história do Papa Sérgio que em 705 (mais ou menos) vivia em Roma, como podemos ver pelo fundo em que está pintado o Castelo de Sant'Angelo, algumas ruínas e a Basílica de São Pedro, antes de Miguel Ângelo, evidentemente. Num sonho, um anjo surge ao Papa Sérgio dizendo-lhe que nomeie um peregrino de nome Huberto para o lugar do bispo de Liège que entretanto tinha sido assassinado. Na mesma pintura lá mesmo atrás à entrada de São Pedro podemos ver o Papa a entregar a São Huberto a mitra e o báculo episcopal, os mesmos que o anjo mostra em primeiro plano. Quer isto dizer que, como já vimos aqui, a história toda pode ser contada num único quadro.

Quanto a Bill Viola, ora vamos lá ver... Este "Going forth a day" de 2002 é um projecto do artista baseado numa projecção vídeo dividida em cinco partes e tal como outras obras faz referência ao ciclos da vida relacionando-os com obras do Renascimento. (O título “Going forth a day” é retirado do "Livro dos Mortos".) As semelhanças e referências às obras dos grandes mestres não se ficam pela aparência geral, mas detém-se nos pormenores. Tal como os pintores do Renascimento que perpetuavam as paredes das capelas e mosteiros com os frescos, também Bill Viola projecta os seus vídeos em cenários monumentais, ainda que os vídeos não tenham permanecido aí. E tal como os frescos do Renascimento têm um suporte que é em si arte, que pode ser percorrido sendo por isso necessário entrar na obra de arte para ver outra obra de arte, também com Bill Viola é necessário na exibição destes vídeos entrar na galeria onde estão a ser exibidos respeitando uma certa religiosidade que o artista confere ao espaço como incentivo cénico. Esta imagem corresponde ao vídeo “The Voyage” que mostra um homem moribundo numa cama (que se prepara portanto para partir), ao mesmo tempo que um barco se prepara para deixar o cais. "E assim acontece:"

Rogier van der Weyden
Dream of Pope Sergius
1437-40
J. Paul Getty Museum, Los Angeles



Bill Viola
Going Forth by day (The Voyage)
2002

3 Comments:

Blogger João Barbosa said...

este até salta à vista...
.
*duque de Borgonha

12/7/10 10:38 da manhã  
Blogger Belogue said...

Corrigido, senhor professor!

12/7/10 12:23 da tarde  
Blogger AM said...

a arte não sei mas miscrolhar é um belo verbo

13/7/10 11:29 da tarde  

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