quinta-feira, outubro 30, 2008

- ars longa, vita brevis -
hipócrates

antes e depois ou como "entre os Futuristas, o Carrá foi aquele que sempre me entusiasmou menos, je ne sais pas pourquoi. Tanto que o dava como Expressionista Abstracto porque o confundi com o Sandro Chia. Já sei que não tem nada que confundir, que são nomes diferentes, mas os dois são italianos e confundi, pronto, o que é que se vai fazer? Este grupo de Futuristas teve um papel muito importante, ainda que breve, na arte italiana. É que desde Tiepolo a Itália não dava ao mundo artistas relevantes no momento. Digo no momento porque muitos foram redescobertos, mas digamos que passado o Maneirismo nunca mais se ouviu falar de arte italiana. Meteu-se o Rococó na Aústria, os Neoclassicismos em França, os Romantismos em França, os Realismos em França, os Impressionismos em França e os Pós-Impressionismos em França e em seguida meteu-se a Primeira Guerra Mundial. Os Futuristas e a Itália sentia-se excluída do debate cultural. Não obstante a Bienal de Veneza criada em 1895, a Itália nunca mais produziu movimentos artísticos, nunca mais esteve na vanguarda. O que motivou o Futurismo foi tudo menos nobre: orgulho nacionalista ferido, algum chauvinismo e a necessidade de marcar posição pela oposição. Numa altura em que a Europa tinha sido assolada pela guerra, guerra essa que se fez com recurso a máquinas bélicas, o Futurismo exacerba a máquina e professa, não sem alguma ingenuidade o desenvolvimento social e económico. Os Futuristas pretendiam começar do zero, "libertar a Itália dos inúmeros museus" (segundo Manifesto Futurista) e mudar a Itália pois já fazia bastante "tempo que a Itália é o grande mercado dos negociantes de velharias" (primeiro Manifesto Futurista). Como, mesmo antes de Mussolini, faziam a apologia do imperialismo, da beleza da guerra, da crueldade da vida e da violência, basearam toda a sua teoria na intuição; ou seja, tudo o que se assemelhasse ao enunciado, era aceite. (A relação com Mussolini é directa. Exacerbavam as potencialidades de um carro de corrida que segundo eles "era mais belo que a Vitória de Samotrácia", e acabaram por ter o seu próprio carro de corrida político; o fascismo de Mussolini que por acaso foi um piloto amador de corridas.) Mas quando se aperceberam que eram para Mussolini apenas uma forma de este propagandear e legitimar o uso da força sem razão, os futuristas, voltaram costas ao Duce e por essa altura já o movimento estava desfeito. Breve, mas capaz de deixar marcas como esta do movimento. Uma das maiores dificuldades dos futuristas deverá ter sido, não sei, calculo, a desadequação entre o que defendiam e o que tinham. Tinham telas e ainda não pensavam em pintar em paredes, nem utilizar objectos nas telas, os usar apenas objectos. Então, como transmitir numa tela, o movimento, a febre do movimento? O Futurismo não era a arte do movimento. A arte do movimento era o cinema e com o cinema, o Futurismo e as suas técnicas não podiam competir. O Futurismo serviu-se um pouco do Cubismo para isto, desenhando vários movimentos associados a actividades que implicavam velocidade, sempre no mesmo espaço na tela. Há até um quadro que mostra isso muito bem, é de Boccioni e tem um cão preto, muito pequeno, em passo apressado. O cão não é mais do que um tufo de pelos pretos que sobrepostos dão a ideia de que o cão vai a correr.


Carrá não era o mais apreciado dos futuristas. Aquele que o público preferia era Gino Severini, muito mais ponderado em relação à excitação com a máquina e com a destruição. Mais ponderado também quando se tratava de passar para a tela essa diferença subtil que se chamava "movimento" e que separava, segundo estes, Futuristas de Cubistas. Mas na maturidade da sua vida artística, quem Roy Lichtenstein preferiu "copiar" ou pelo menos, recriar, foi Carlo Carrá e o seu Cavaleiro Vermelho. Não abdicou no entanto da técnica da impressão gráfica e da fotografia de jornais e revistas, que ampliada deu origem ao célebre pontilhismo dos seus quadros. Mas ao escolher Carlo Carrá e os Futuristas, ele domestica o traço rigoroso do movimento, de tal forma que deixa de ser movimento para passar a ser contenção:"

Carlo Carrá
Cavaleiro Vermelho
1913
Pinacoteca di Brera, Milão


Roy Lichtenstein
Cavaleiro Vermelho
1974
Museum Moderner Kunst, Viena

1 Comments:

Blogger João Barbosa said...

Não conhecia este do Liechtenstein. é claramente (para mim) mais interessante do que o original.

30/10/08 10:42 da manhã  

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