quinta-feira, dezembro 27, 2007

- o carteiro -

notícias do mundo da arte que não interessam nem "ao Menino Jesus":
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Alonso Sanchez Coello
Portrait de Don Diego, fils de Philippe II d'Espagne
1577
Liechtenstein Museum, Viena
O retrato andava a ser disputado pelo Reino Unido e pelo Museu Liechtenstein, pertencendo no entanto a este último. Trata-se do Portrait of Don Diego, do pintor espanhol Alonso Sanchez Coello, datado de 1577 e que a National Gallery queria comprar há algum tempo. Em que moldes aconteceu não se sabe ao certo, mas eis o que se sabe:

O quadro era portador de uma licença passada pelo príncipe do Liechtenstein, que permitia a sua circulação e retorno, obviamente, à origem, licença essa que foi considerada inadequada e inválida pela ministra da cultura inglesa justamente quando se encontrava em território inglês. O quadro encontra-se agora retido na National Gallery a aguardar o fim de uma investigação que pode demorar anos a ver uma conclusão. Acontece que quem dita os moldes da licença é uma entidade inglesa e a ocultação de informações relevantes que deveriam constar na mesma podem ser o suficiente para que esta se torne obsoleta. O problema que se levanta é o seguinte: estando a National Gallery há muito tempo interessada no quadro, terá o organismo que elabora os trâmites da licença sido omisso para beneficiar a galeria?

Para além disso, a investigação também terá de recair em Simon Dickinson, um negociante de arte que foi preso a 13 de Setembro devido a irregularidades na exportação de obras de arte e nos grupos organizados de exportação de pinturas de grande valor, nas quais podemos incluir este quadro de Coello. Simon Dickinson estaria encarregue da venda de algumas pinturas da colecção do príncipe do Lichentenstein. O problema está não só na retenção do quadro em Inglaterra, como se não fosse um bem com um dono, em saber se alguma entidade redigiu propositadamente mal as condições de empréstimo com vista a que o quadro ficasse em território inglês e por fim, ver se o valor pelo qual foi avaliado, dentro de um “pacote” de pinturas várias, não fica aquém do seu valor real.
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Toda a gente conhece Bansky. Quem não conhece arrisca-se a conhecer e a ficar conhecido porque o artista de rua oferece os trabalhos que faz. Mas nem toda a gente gostaria de conhecer Bansky e talvez ele não gostasse de conhecer todos para quem pinta. E porque estamos em clima de festa, porque é Natal, nada melhor que juntar Bansky e Belém. Ocorrem-me muitas traquinices para Bansky fazer em Belém, muitos trocadilhos, muitas piadas com a virgindade de Maria e o ar sério do Menino que acabou de nascer e o sono de S. Pedro… mas Bansky escolheu a região por outros motivos; por motivos políticos. E os naturais de Belém não gostaram. Como tal cobriram o desenho de Bansky que deveria ser para representar a luta dos autóctones. Bansky pintou seis imagens em toda a cidade de Belém que tinham como objectivo aumentar o turismo em época baixa (todo o ano excepto no Natal), bem como dar a conhecer as condições em que os palestinianos viviam na zona ocupada. Num dos desenhos era possível ver um soldado israelita a fazer vistoria nos papéis de identificação de um burro, imagem que causou a ira em alguns residentes em Belém, uma vez que consideravam que na imagem eles eram os burros. E tanto na sociedade palestiniana como na nossa, ser chamado de burro é ser chamado de idiota! Havia quem conseguisse ver o mural por outro lado considerando ofensivo para os israelitas que perdiam tempo com burros em vez de o verem como ofensivo para palestinianos.
Belém é um território cercado de postos de controlo israelitas que os consideram essenciais para a defesa da cidade. Os palestinianos que nela habitam consideram que estes postos de controlo limitam o crescimento económico da cidade e afugentam o turismo.
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O ano que passou foi pródigo em novidades no mundo da arte. E feiras. E polémicas. E nomes que foram surgindo… Nem todos merecidos, na minha opinião e nem todos bem investigados… Um desses nomes que talvez não valha duas linhas e que aqui vai levar muito mais, é o de Lluis Barba, o artista espanhol que esteve presente este ano na Arte Basel Miami Beach – o supermercado de arte dos milionários – e que apresentou obras com uma clara piscadela de olho à cultura pop. Ora o que me incomoda não é essa piscadela de olho, é a forma como ela é desprovida de qualquer propósito maior, como não pretende nada a não ser o entretenimento, a elevação a um estado pseudo-interessante e promissor, como não induz ao pensamento crítico, como não é crítica… Enfim, tudo isso me aborrece ao ver que um artista (e não coloco entre aspas porque nunca questiono o valor de uma pessoa até prova em contrário) como Lluis Barba não se dá ao trabalho mínimo de colocar as personagens certas nos lugares certos.
O que Lluis Barba faz é na prática tomar quadros de relevo como “O nascimento da Primavera” de Botticelli, coloca uma máscara em tudo o que não lhe interessa e muda os protagonistas da história substituindo-os por pessoas do jet-set internacional. Se eu quisesse ver pessoas do jet-set internacional e eu não fosse uma delas, não fosse um dos retratados, comprava revistas, não ia ver a obra dele.
Mas dando o benefício da dúvida (como se Lluis Barba precisasse dele para alguma coisa) ao artista, lá parti para a observação mais atenta do redesenho do “Garden of Earthly Delights” de Bosch pintado originalmente em 1504. Nesta versão e no painel dedicado aos demónios, algumas personagens do original foram substituídas por outras mais conhecidas, pertencentes ao mundo da arte, estrelas de cinema e aspirantes a tal, modelos e amigos do próprio pintor. Segundo o autor esta seria a sua crítica ao fechado mercado da arte. Segundo eu, não funciona! Kate Moss surge no quadro por para Barba é tão importante para o nosso tempo como Warhol foi para o dele. Mossa perece na parte dedicada ao Paraíso, em calções curtos e com o seu ar inocente, Elton John. Madonna, Brad Pitt e Pavarotti surgem no mundo terreno e no mundo subterrâneo dedicado às personagens estranhas estão pessoas relacionadas com o mundo da arte. Por exemplo, Jay Jopling, o galerista que vendeu a caveira de Damien Hirst, fala ao telemóvel enquanto entra alegremente para o Inferno. E como ele outras pessoas que por ali passeavam enquanto se viam no quadro de Bosch que agora é de Barba. Uma criança perguntava ao pai: “porque é que estavam lá pessoas que vieram no nosso avião?”
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